Latinoamérica
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A crise do pt, a direita e a esquerda
"Não se pode separar mecanicamente as questões políticas das questões de
organização"."
Lênin
"O peixe apodrece pela cabeça."
Mão-Tse-Tung
A crise do PT pode aparecer como uma crise dos métodos de ação do partido. A
crise parece ter sido exportada para o Congresso e o partido, buscando apurar
que parlamentares estariam envolvidos na compra de votos e de que forma membros
do partido teriam operado para fazer isso, assim como para financiar atividades
partidárias com recursos paralelos. O PT teria construído uma enorme máquina
partidária – que estenderia seus braços e pernas na direção dos governos e dos
parlamentos –, "confundindo partido com Estado", como afirmou na sua casa uma
renomada revista "bushista" brasileira.
Mas se foi construída uma estrutura monstruosa na direção do PT, que agora
parece ser condenada por todos ou quase todos, ela é apenas a contrapartida da
linha política que o partido foi adotando. Da mesma maneira para a forma é a
forma de um conteúdo, a estrutura organizativa é a forma de uma linha política.
A compreensão de uma é inseparável da compreensão da outra.
A orrganização é a expressão de uma estratégia
Essa mesma imprensa saúda as transformações políticas que o PT teve, passando a
ser um partido "responsável" na sua política econômica, contente com a sua
redução a um partido que cuida das condições de reprodução do modelo econômico
vigente. Mas para que isso fosse possível, o partido teve que sofrer grandes
transformações. Estas já se refletiam nas campanhas presidenciais anteriores, em
que as equipes que dirigiam as campanhas foram se autonomizando cada vez mais em
relação ao partido, até o limite que foi o Instituto da Cidadania o responsável
pela elaboração do programa da campanha presidencial de 2002. Porém, o processo
de autonomização ganhou outro patamar, porque nem sequer este programa vingou,
conforme as decisões fundamentais foram transferidas para um círculo estreito em
que Palocci e Duda Mendonça acabaram tendo o peso essencial. O partido foi sendo
neutralizado, reservando suas instâncias para os embates de tendências, que
definiam candidatos a outros cargos, mas reservando o que se referia à campanha
presidencial cada vez mais para o círculo constituído em torno de Lula.
Mas – como afirma Lênin – não existe separação mecânica entre as questões
políticas e as de organização. Por que?
A organização de um partido de esquerda é sempre instrumento de seu programa e
de sua estratégia. O conhecido debate entre os bolcheviques e os mencheviques,
há exatamente um século, mais além do seu contexto específico, revela como
estratégias diferentes requeriam partidos diferentes. Se se tratasse da luta
democrático-burguesa, pelo caráter desta, se necessitaria de um partido amplo,
parlamentar, sem maior seletividade no recrutamento, um partido de massas. Se se
tratasse de uma luta revolucionária para derrubar o tzarismo, mas também romper
com o capitalismo, seria necessário um partido que pudesse sobreviver e atuar na
clandestinidade, com militantes ativos, escolhidos seletivamente, dedicados
prioritariamente à militância política. O debate se dá sobre a forma de partido,
paralelamente à discussão estratégica sobre a etapa da luta política da esquerda
russa.
A discussão sobre o tipo de organização partidária não é uma questão técnica,
mas política. A questão: "Que tipo de partido?" tem que ser decorrente de outra:
"Partido, para que?" Para que tipo de política? Com que tipo de objetivo? Qual a
estratégia requer cada tipo de partido?
A forma de organização é a expressão de um tipo de estratégia. As crises
organizativas são expressões das crises de estratégia dos partidos.
Se o governo do PT aplica um programa similar ao de outros partidos, se assume a
herança econômica do governo FHC de forma explícita – conforme palavras do
Ministro da Fazenda -, não é estranho que atue como outros partidos, que deixe
de ter especificidades e seja um partido como os outros.
Se a forma de organização do PT está abertamente em crise, ela reflete o
esgotamento de uma estratégia. O PT pode se reorganizar para adequar-se
institucionalmente a ser o partido que o governo – com sua cara atual – requer e
ai estará formalizando organizativamente seu esvaziamento. Ou poderá definir
suas relações com as forças sociais motoras da luta anti-neoliberal e anti-capitalista.
Isto requerirá uma profunda revolução democrática no seu interior, uma espécie
de choque de "gramscianismo", porque o partido sempre se situou em um universo
teórico pré-gramsciano, sem se propor a construir um modelo hegemônico
alternativo ao predominante no país – com todos os seus desdobramentos no plano
de um modelo econômico anti-neoliberal, de propostas de universalização dos
direitos sociais, de valores de democracia cultural, de refundação do Estado
brasileiro – não apenas do sistema político-eleitoral.
Transformações ideológicas, políticas e organizativas
É nesse marco que tem que ser pensadas as transformações do PT como partido e
sua crise atual. Se ao longo dos últimos anos – particularmente da última década
– o PT foi modificando sua plataforma, suas definições políticas, suas formas
prioritárias de ação, sua prática, essas mudanças tiveram seus correlatos nas
formas de organização. Estas se expressaram no aprofundamento que o PT – pela
vontade originária de diferenciar-se do leninismo – chamou de "partido de massas",
em oposição ao que seria um "partido de quadros". Mas se expressaram também no
tipo de